FATALIDADE

Chuvas: urbanista aponta falta de política habitacional como causa de mortes

"Qual o local dos pobres na cidade? Sempre em áreas distantes, em áreas de risco?", questionou a arquiteta e urbanista

Ísis Lima
Ísis Lima
Publicado em 25/07/2019 às 17:55
Brenda Alcântara/ JC Imagem
FOTO: Brenda Alcântara/ JC Imagem

O inverno em regiões como a Região Metropolitana do Recife e a Zona da Mata de Pernambuco costuma estar associado à grande ocorrência de chuvas. Lamentavelmente, também são comuns episódios que levam a mortes e outros prejuízos emocionais, financeiros e materiais, como deslizamento de barreiras, transbordamento de canais e queda de árvores. Mas por que ainda registramos tantos problemas e óbitos associados à questão das chuvas? Foram 12 óbitos no Grande Recife somente nesta quarta-feira (25). Entre eles, um adolescente e uma jovem gestante.

A arquiteta e urbanista Ana Ramalho é pesquisadora e professora universitária com pós-doutorado em desenvolvimento urbano pela UFPE e falou sobre a situação em entrevista à Rádio Jornal.

Para a pesquisadora, essas fatalidades não podem ser classificadas como acidente. “Temos que tratar o problema na sua origem. Enquanto não enfrentarmos de fato a política habitacional das cidades brasileiras, muita gente, infelizmente, ainda vai morrer porque todo mundo precisa de moradia. E moradia numa cidade como Recife o solo é caro, é escasso e leva a parte dessa população à improvisação”, afirmou, criticando a culpabilização das pessoas que moram nessas áreas de risco.

A arquiteta critica a falta de moradias para essa população, geralmente, mais carente, em regiões próximas dos centros das cidades. “Se promove algumas habitações em locais distantes (...) As pessoas precisam ter condições de habitabilidade, não é só uma casa como abrigo. É uma casa próxima aos serviços, com infraestrutura, próxima às condições de trabalho, onde ele pode reduzir o ir e voltar diário e associado a um outro problema grande das nossas cidades que é a dificuldade com a mobilidade. Óbvio que, cada vez mais, as pessoas vão querer morar perto dos seus serviços”, disse.

Ana Ramalho aponta que, em paralelo à resposta dos governos de falta de alternativas para o problema, existem áreas vazias nos centros das cidades. “Será que não poderíamos ter alternativas e conciliar essas áreas mais próximas para a população mais pobre? Qual o local dos pobres na cidade? Sempre em áreas distantes, em áreas de risco?”, questionou a especialista.

Prevenção

A professora aponta que é importante que as cidades se preparem para receber o grande volume de chuvas. “Sempre choveu muito e sempre vai chover. Agora, as cidades podem se preparar para esse número elevado de águas que ocorre em determinados períodos que já se sabe. Se precisa pensar previamente (...) Quando se já é recorrente o número de óbitos, nada de normal tem nisso”, destacou.

Segundo a pesquisadora, é preciso eliminar o risco para essa população que mora em áreas de morro. “Nossa população do Recife historicamente ocupou os morros. Não deveria ter ocupação, mas a gente não tem como tirar essa população. Historicamente, o que se fez? Eliminou o risco desse morro com revestimento e infraestrutura”, disse. “Agora, tem áreas que pela declividade, pelo corte da barreira, não podem ser ocupadas de forma alguma. A prefeitura precisa fiscalizar e monitorar, criar seus mapas de riscos para que se identifique onde não pode ter ocupação nenhuma e, principalmente nessa época de chuvas, ter uma fiscalização constante, inclusive de informação a essa população”, completou.