ELEIÇÕES

Representatividade: não é toda pessoa negra que vai defender bandeiras da negritude, diz advogada

Advogada falou sobre importância da representatividade no processo democrático

Ísis Lima
Ísis Lima
Publicado em 14/10/2020 às 16:43
Marcello Casal jr/Agência Brasil
FOTO: Marcello Casal jr/Agência Brasil

Dados da Justiça Eleitoral Brasileira revelam que os gabinetes das 95 maiores cidades do país estão sendo concorridos, neste ano, majoritariamente por homens. Para se ter uma ideia, oito em cada dez candidatos a prefeitos nessas cidades, são do sexo masculino. Com destaque para as regiões Nordeste e Norte. Quando consideramos a cor de pele declarada por esses candidatos, 70% deles são brancos.

Para a advogada e presidente da Comissão de Igualdade Racial da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE), Manoela Alves, é importante que o candidato eleito entenda que ele assume para atender aos interesses coletivos. “No Brasil, a gente vive num regime representativo. Quem assume um cargo, seja no executivo ou legislativo, é uma pessoa que assume para atender não os seus interesses, mas os interesses da coletividade. O que a gente entende por representatividade é que quanto mais essa pessoa tiver as vivências da população, conhecer a realidade, tanto da elite quanto da periferia, a gente vai poder gozar de um governo mais inclusivo”, comentou. “O número [maior] de candidatos a prefeitos ainda ser homem e branco é uma manutenção de privilégios. Isso é um processo histórico. A ideia é que a gente continue incentivando políticas afirmativas”, completou.

No entanto, ela pondera que o eleitor que está em busca de representatividade que é importante saber o projeto do candidato. “Não é toda pessoa negra que a gente coloca lá que vai defender as bandeiras da negritude. Não é toda mulher que vai defender a bandeira da equidade de gênero. Aí é um segundo passo da representatividade. A primeira é a gente enquanto sociedade se ver lá. A segunda é a gente procurar as propostas para ver se quem vai chegar lá não vai servir a um sistema, que hoje é discriminatório, calcado no racismo estrutural”, alertou. “Representatividade não consiste só na cor. Muitas vezes a gente confunde isso. ‘Mulher tem que votar em mulher’. Acho que é interessante a gente ter essa lógica, mas vamos ver o que essa mulher propõe. Muita gente que é colocada lá a serviço de um sistema discriminatório”, complementou.

Mudança social

Ainda de acordo com a advogada, é preciso quebrar estigmas quanto aos padrões de liderança. “A gente precisa que partidos políticos se comprometam com a preparação de lideranças que sejam negras, que pessoas negras sejam empoderadas para estar ocupando espaços de poder e a gente precisa, na prática, que a própria sociedade, a partir da lógica da vivência, desconstrua esse perfil de que poderoso é aquele homem branco, em via de regra, barbudo, porque mostra uma experiência, denota confiança. Tudo isso são estigmas sociais”, disse. “A sociedade é extremamente diversa, mas ainda cultua padrões que não atendem ao que a gente é na realidade”, completou.