FISIOTERAPIA

Exercícios simples estimulam o desenvolvimento de bebês com microcefalia

Na AACD, calças jeans dão vida a almofadas perfeitas para os exercícios de estimulação dos bebês com microcefalia

Da Agência Brasil
Da Agência Brasil
Publicado em 09/04/2016 às 14:00
A fisioterapeuta Cynthia Ximenes da Associação de Assistência à Criança Deficiente estimula a pequena Maria Vitória que tem microcefalia. Foto: Sumaia Villela/Agência Brasil


Para começar a sessão, a fisioterapeuta coloca os bebês em almofadas adaptadas para os exercícios: trata-se de calças jeans preenchidas com sacolas, retalhos e papel, que são amarradas ou costuradas nas extremidades. Uma ferramenta simples, mas que é um dos principais apoios para a condução da fisioterapia com os bebês e, principalmente, que pode ser recriada em casa pelas mães, como ensina e recomenda e profissional.

“Tudo o que a gente faz aqui a gente demonstra para as mães porque é muito importante essa continuidade [do tratamento] em casa e essa parceria entre família e terapia é de extrema importância para o desenvolvimento deles. Aqui nós focamos nos alongamentos, pois são bebês que, por conta da alteração neurológica, apresentam aumento de tônus muscular, então são muito durinhos”, explica Cynthia Ximenes, fisioterapeuta Cynthia Ximenes, na Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD).

Iara Oliveira Gonçalves, de 23 anos, mãe de Maria Vitória, já tem a almofada-calça em casa. A avó da bebê costurou de presente. Iara se esforça para colocar em prática diariamente cada ensinamento passado pelos médicos. “Para o estímulo visual eu aprendi a colocar coisas coloridas. Por exemplo, pegar uma mamadeira e enfeitar para ela brincar, procurar brinquedinho que faça barulho, colorido, para colocar na frente dela e ver se ela vai acompanhar a visão ou não. Colocar para fazer exercício, colocar ela apoiada na almofada-calça que ensinaram a gente a fazer, que é para ajudar, estimular, botar ela sentadinha, emborcada, ver como vai ter força para segurar o pescocinho, ir se desenvolvendo mais”, diz a ex-manicure, que agora se dedica exclusivamente à filha.

Assim como os objetos usados na fisioterapia, os exercícios também são simples e replicáveis pela família. “A gente ensina as mães como alongar as mãos, as pernas, os braços, os pés, como fazer os exercícios em casa e principalmente proporcionar às crianças as variações de postura durante o dia”, ensina Cynthia. Quem já viu técnicas complexas para a recuperação de atletas ou acidentados pode estranhar, mas a terapia deve acompanhar a idade do paciente, segundo a profissional: “lógico que um bebê de um mês, dois meses a gente não vai colocar para rolar, para sentar, porque nenhum bebê nessa idade está nesta etapa motora. Mas esses posicionamentos são muito importantes lá na frente, para que a gente possar continuar com outros exercícios respeitando a idade e o tempo de cada criança”.

Desafios e benefícios

A esses primeiros estímulos em recém-nascidos dá-se o nome de estimulação precoce. A técnica é usada com qualquer criança que apresente fatores de risco, como bebês prematuros, e não apenas os microcéfalos. “A gente começa com a intervenção em uma criança que você sabe que tem risco de ter um problema neurológico antes que apareça. A microcefalia é um sinal, não uma alteração no exame neurológico de força, movimento, desenvolvimento”, diz a neuropediatra Vanessa Van der Linden, gerente médica da AACD.

De acordo com Vanessa, os primeiros encontros com a mãe e o bebê são de diagnóstico, para avaliar as dificuldades e traçar objetivos. Segundo a neuropediatra, cada caso deve ser analisado separadamente, já que as malformações em crianças infectadas pelo vírus Zika são bem variadas. “Tenho pacientes muito graves e outros menos graves. Então a gente vê crianças que tem interação boa, sorriso, que presta atenção, isso já mostra que a criança tem interação com o que está acontecendo com o mundo. Outras estão alheias. Temos que acompanhar [os bebês] pelo menos até os dois anos para tentar definir as principais alterações que se vê em crianças desse tipo”, afirma.

A neuropediatra deixa claro, no entanto, que a reabilitação não significa cura das complicações neurológicas. “Reabilitação estimula o potencial que o cérebro tem. A gente não trabalha com 100% do nosso potencial, a gente vai usando aquilo que é estimulado, diz. “Para uma criança que não tem problema, o ambiente de casa e da escola é suficiente para dar os estímulos necessários. Já para uma criança que tem dificuldade você precisa dar um estímulo bem maior para conseguir um resultado pequena”, completa.

Apesar de os resultados desse trabalho serem vistos, principalmente, a longo prazo, pequenas conquistas são comemoradas tanto pelas mães como pela fisioterapeuta Cynthia Ximenes. “Nós observamos evoluções a curto prazo. Em um encontro o pescoço estava muito molinho. A mão estava muito fechadinha e com os alongamentos vão abrindo um pouco mais”, exemplifica Cynthia.

Iara também cita, orgulhosa, os avanços observados na filha: “Antes ela não segurava muito bem... ainda não está totalmente segurando o pescoço, mas já vi que ela fica mais tempo com o pescoço levantado, fica brincando com a mão e o pezinho, e antes ela não fazia. Eu fico estimulando em casa, boto o dedo na mão dela, faço força para ela levantar. Já tô vendo que ela está ficando bem mais durinha”, comemora a mãe de Maria Vitória.