LUTO

Aos 105 anos, morre Dona Elzita Santa Cruz, símbolo contra a ditadura

Dona Elzita ficou conhecida por lutar pela verdade após o desaparecimento do seu filho Fernando Santa Cruz, na época da Ditadura Militar

Pedro Guilhermino Alves Neto
Pedro Guilhermino Alves Neto
Publicado em 25/06/2019 às 10:55
Alexandre Severo/Acervo JC imagem
FOTO: Alexandre Severo/Acervo JC imagem

Faleceu na manhã desta terça-feria (25), aos 105 anos, Dona Elzita Santa Cruz, mãe do desaparecido político Fernando Santa Cruz. Após o sumiço, que ocorreu no período da Ditadura Militar, em 1964, Dona Elzita percorreu prisões e unidades militares, enviou cartas aos ministros de Estado e presidentes da República, além de solicitar ajuda da Anistia Internacional e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos em busca do filho. Seu velório acontece nesta terça, a partir das 13h, na Câmara Municipal de Olinda. Já a cerimônia de cremação será nesta quarta-feira (26), no cemitério Morada da Paz, em Paulista, no Grande Recife.

Segundo seu filho, o ex-vereador de Olinda, Marcelo Santa Cruz, Dona Elzita era uma guerreira e se tornou um símbolo de luta e determinação. "Era uma pessoa lutadora, nunca parou de denunciar o sumiço do seu filho. Ao longo dos seus anos de batalha, ela se tornou mãe de todos os mortos e desaparecidos da época da Ditadura Militar. Lutou por uma boa causa, em defesa da paz", disse.

Ao JC, Marcelo lembrou que sua mãe completaria 106 anos, no próximo dia 16 de outubro e que era uma 'dádiva' conviver com Dona Elzita.

O exílio de Marcelo Santa Cruz também amargou a vida de Dona Elzita. Ele foi enquadrado no decreto 447, da ditadura militar, e expulso da faculdade. Morou na Europa e retornou um ano e meio depois ao Brasil. Ele residiu no Rio por dez anos e só pôde voltar a Olinda com a anistia política.

A perda

A maior dor da vida de Dona Elzita foi a perda do filho Fernando, ao qual nunca teve o direito de sepultar. Ele participava do movimento estudantil, seguindo uma orientação da Ação Popular Marxista-Leninista. Ele precisou sair do Recife, após ser preso em frente da Assembleia Legislativa, e foi morar no Rio. No Carnaval de 1974, Fernando foi preso e, possivelmente, torturado até a morte pelos agentes do DOI-Codi.

Inconformada com o desaparecimento do filho, Dona Elzita dedicou a sua vida à elucidação dos crimes cometidos pelo DOI-Codi durante a ditadura militar, representando a luta das famílias dos mais de 140 desaparecidos políticos. Em 1981, participou da fundação do PT, partido que é filiada até hoje, e do Movimento pela Anistia em Pernambuco. Ganhou notabilidade ao receber o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, em 2010, concedido pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Nos últimos meses está calada. No balanço da sua cadeira, não lembra mais de tudo o que lhe aconteceu. Porém, o olhar sereno e acolhedor revela uma mãe que, apesar de todo o sofrimento, transborda amor.