CORONAVÍRUS

Economista avalia que retomada das atividades em meio à pandemia irá penalizar as mulheres

Com escolas e creches fechadas por conta da pandemia, mulheres terão ainda mais dificuldades para conciliar as funções

Ísis Lima
Ísis Lima
Publicado em 05/06/2020 às 17:07
Felipe Ribeiro/ JC Imagem
FOTO: Felipe Ribeiro/ JC Imagem

Apesar dos números da pandemia do novo coronavírus serem preocupantes no Brasil, alguns estados, inclusive Pernambuco, já estão com planos para retomada das atividades econômicas em ação. Essa volta, no entanto, ignora a realidade de milhares de mulheres trabalhadoras e que têm filhos. Com as aulas presenciais em escolas e o acolhimento em creches suspensos, essas mães terão ainda mais dificuldade para conciliar as funções.

A economista e pesquisadora da área de mercado de trabalho do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Lúcia Garcia lembrou que muitas vezes essas mulheres são a principal fonte de renda das famílias brasileiras e serão as principais afetadas com essa retomada em meio à pandemia. “Nós temos uma anarquia econômica. Alguns setores voltam, outros parcialmente, outros não. Os serviços sociais, como educação, não podem voltar porque o risco é absoluto nesse momento e as mulheres ficam numa encruzilhada pois elas devem retomar suas atividades econômicas. Entretanto, as mulheres que já não contavam com creches em volume suficiente, com uma escola em tempo integral, agora estão numa situação ainda pior porque não existe escola nenhuma”, afirmou a especialista. “Nós temos um tipo de insensibilidade generalizada na política pública que vai penalizar, mais uma vez, as mulheres”, enfatizou.

O Brasil, é o novo epicentro mundial da pandemia do novo coronavírus. Somente nesta quinta-feira (4), foram confirmados 1.473 óbitos pela covid-19. Mais um recorde diário de mortes. Até ontem, o país somava 34.021 vidas perdidas para a doença. O país está em terceiro lugar de um ranking mundial em relação ao número de mortes pelo coronavírus, ficando atrás apenas do Reino Unido e dos Estados Unidos.

Creches e escolas são essenciais

De acordo com a economista Lúcia Garcia, mais à frente com a retomada das atividades em um novo patamar de normalidade será preciso resgatar o papel do Estado na educação e no cuidado com as crianças. “Nós precisamos de creches comunitárias, escolas, [Precisamos] De fato de uma responsabilização com relação ao cuidado e o desenvolvimento das crianças, conforme o Plano Nacional de Educação prevê”, disse.

Ela reforça a necessidade de incluir a construção de escolas infantis e creches na pauta. “Essa é uma pauta extremamente importante junto com outras questões que são relacionadas aos cuidados e os afazeres domésticos. A gente [precisa] coletivizar o entendimento de que o cuidado [das crianças] não é individual, mas é da sociedade, que deve cuidar e educar. Não é uma mãe isolada que deve educar sozinha”, comentou.

A economista lembra que essa é uma questão que prevista, inclusive, na Constituição Brasileira. “A Constituição de 1988 nos deu base para essa mudança de situação e deu origem ao Plano Nacional de Educação, onde temos a garantia de creches e escolas infantis para crianças no Brasil”, apontou. “Nós temos é que fazer valer as políticas públicas brasileiras. É assim que vamos proteger essas mães e essas crianças”, concluiu.

O caso de Mirtes, mãe de Miguel

A economista lembrou a situação da empregada doméstica Mirtes Renata, mãe do garoto Miguel Otávio, que estava no ambiente de trabalho e precisou levar o filho de apenas 5 anos. Enquanto Mirtes passeava com o cachorro de sua patroa, a empregadora negligenciou o cuidado com a criança que acabou morrendo após cair de uma altura de 35 metros.

“Nós temos uma trabalhadora que deveria estar protegida e não na casa de patrão algum. Uma trabalhadora que é tensionada a cuidar de um cachorro quando uma mulher adulta é incapaz de cuidar de cuidar de uma criança”, comentou. “Evidentemente, nós não estamos em condição de retomada econômica no Brasil e as mulheres são as que mais sofrem”, completou a economista.