ECONOMIA

Para economista, taxar grandes fortunas é questão mais política do que de contas públicas

Taxar grandes fortunas tem sido alvo de debate como forma de diminuir as desigualdades sociais

Ísis Lima
Ísis Lima
Publicado em 06/08/2020 às 18:20
Marcos Pastich/PCR
FOTO: Marcos Pastich/PCR

A divulgação na semana passada de uma lista de 42 brasileiros que ficaram 34 bilhões de dólares (cerca de R$ 177 bilhões) mais ricos durante a crise da pandemia do novo coronavírus fez crescer a pressão para que a reforma tributária tire do papel o imposto sobre grandes fortunas e aumente o imposto de renda dos super-ricos com o objetivo de diminuir a desigualdade social no país. O levantamento foi feito pela ONG Oxfam.

O economista fundador do Mercado Popular, Pedro Menezes, acredita que a pauta está mais relacionada à política do que a uma mudança nas contas públicas do país. “Quando a gente lembra que o auxílio emergencial, por exemplo, custa R$ 50 bilhões por mês, algo como R$ 600 bilhões por ano, ou que o nosso sistema de previdência custa perto de R$ 1 trilhão, que o Estado brasileiro gasta mais de R$ 2 trilhões por ano no geral, a gente vê que não é esse imposto que vai mudar a capacidade de arrecadação do Estado brasileiro e a capacidade de prover mais políticas públicas. Por outro lado, pelo ponto de vista da justiça social, eu entendo que a sociedade discuta esse tipo de imposto talvez porque pessoas muito ricas possam ter uma influência desproporcional no processo político, por exemplo, através de doações para campanhas. Eu entendo essa [questão] muito mais como uma questão política do que como uma questão de contas públicas, questão fiscal”, detalhou.

Menezes explica como funciona a arrecadação de impostos no Brasil. “Os impostos são concentrados no consumo e não na renda ou na riqueza, como seria o imposto sobre grandes fortunas. A renda é o que a gente tem todo ano aumentando o nosso patrimônio, o que a gente recebe do trabalho, o que a gente recebe de investimento da bolsa de valores e o consumo é o imposto que a gente paga quando vai ao supermercado. Os impostos do Brasil são muito focados nesse imposto do consumo”, disse.

Pobres são mais prejudicados, mas toda população sofre

O economista fala como as falhas no sistema tributário afetam o trabalhador assalariado. “A empresa onde essa pessoa trabalha é muito menos eficiente do que poderia ser, porque o sistema tributário é completamente desorganizado. Essa pessoa paga alíquotas muito altas em produtos essenciais como energia elétrica, telefonia (...) como a tributação sobre a renda é baixa, isso acaba pesando no imposto sobre consumo, que esse público paga. Ele, como assalariado, tem também o imposto que incide sobre a própria folha de salário dele, que come uma parte considerável do que o empregador poderia pagar todo mês. Inclusive, os mais pobres no Brasil são os mais prejudicados por esse manicômio tributário (...) Toda população é prejudicada. A gente tem uma situação muito grave no Brasil, que deveria ser reforma para ontem”, explicou.

Por fim, Pedro Menezes aponta que a reforma tributária não deve interferir na forma como esses impostos seriam melhor aplicados para benefício da população, mas defende que a medida é importante para diminuir problemas como a desigualdade social. “Com a reforma tributária é mais difícil resolver essa parte da aplicação, mas, de fato, a gente pode resolver outros problemas como a desigualdade, colocar mais impostos sobre a renda, menos impostos sobre consumo”, disse. “Apesar d’eu ter dito que o imposto sobre grandes fortunas não tem uma capacidade de arrecadação muito grande, o Imposto de Renda tem uma capacidade de arrecadação significativa (...) Como o Brasil é um país muito pobre, para que a gente faça esse esforço de diminuir a tributação sobre quem é mais pobre e aumentar sobre quem é mais rico, a gente não vai só envolver o super-rico, o dono da multinacional, a gente vai precisar de uma compreensão daquela população que se considera classe média alta e também é menos tributada do que deveria ser”, finalizou.