O que é rachadinha?

O que é rachadinha? Entenda o que significa esquema pelo qual família Bolsonaro é investigada

Áudio de ex-cunhada de Jair Bolsonaro indica que presidente teria relação direta com rachadinhas. Senador Flávio Bolsonaro é investigado

Gabriel dos Santos Araujo Dias
Gabriel dos Santos Araujo Dias
Publicado em 05/07/2021 às 12:40
Marcelo Camargo / Agência Brasil
FOTO: Marcelo Camargo / Agência Brasil

Quem acompanha o noticiário político está acostumado a ouvir que o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) é investigado pela suposta prática de rachadinha, quando foi deputado estadual. Nesta segunda-feira (5), áudios de uma ex-cunhada de Jair Bolsonaro, divulgados pelo portal UOL, também apontam para a possibilidade do próprio presidente da República ter envolvimento direto com o esquema. Mas, afinal de contas, o que é rachadinha na política?

Na prática, a rachadinha acontece quando um funcionário público é obrigado a devolver parte do próprio salário para um político ou assessor. "É uma divisão de proventos, de alguma vantagem financeira, por deliberação de um agente público", disse à BBC Brasil a constitucionalista e mestre em direito público administrativo pela Fundação Getúlio Vargas, Vera Chemim.

A rachadinha pode acontecer de várias formas, aponta a professora de direito administrativo da Escola de Direito do Brasil Marilda Silveira. "Uma forma bastante comum é se aproveitar de alguém que está desesperado para conseguir um emprego e fazer com que o funcionário divida o dinheiro de sua remuneração".

Áudios gravados pela ex-cunhada de Bolsonaro, Andrea Siqueira, disse que Bolsonaro mandou demitir um irmão dela porque o homem não queria devolver parte do salário. "O André deu muito problema porque ele nunca devolveu o dinheiro certo que tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6.000, ele devolvia R$ 2.000, R$ 3.000. Foi um tempão assim até que o Jair pegou e falou: 'Chega. Pode tirar ele porque ele nunca me devolve o dinheiro certo', disse a mulher.

Em alguns casos, o “empregado” não desempenha as funções. Não chega nem a ir até o local de trabalho. Neste caso, os chamados “funcionários fantasma” simplesmente ficam com parte do dinheiro público e repassam outra parte para o “empregador” ou, na tentativa de despistar possíveis investigações, dá parte do dinheiro para um familiar do político. "O combinado pode ser, por exemplo, enviar uma fatia do dinheiro para a irmã do político", disse.

Nas investigações do caso Flávio Bolsonaro, por exemplo, chamou atenção dos investigadores um depósito de um cheque no valor de R$ 24 mil realizado pelo ex-policial Fabrício Queiroz na conta da esposa de Jair Bolsonaro, Michelle Bolsonaro.

 Fabrício Queiroz era lotado no gabinete do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).
Fabrício Queiroz era lotado no gabinete do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).
Reproduz/ Facebook

O presidente diz que o depósito foi feito para pagar um empréstimo que teria sido feito a Queiroz por Michelle. Fabrício Queiroz trabalhava para Flávio e é considerado o operador do esquema de rachadinha no gabinete do filho do presidente. No total, os investigadores identificaram que Queiroz recebeu R$ 2 milhões através de 483 depósitos feitos por 13 assessores de Flávio Bolsonaro. Ou seja, caso se confirme o esquema de rachadinha, significa dizer que 13 assessores do filho do presidente devolveram, várias vezes, parte de seus salários e os valores “devolvidos” podem ter chegado a R$ 2 milhões.

Rachadinha é crime?

Se rachadinha é crime, isso não é consenso entre juristas. Há quem enquadre a prática no crime de concussão (obtenção de vantagem indevida em razão da função), previsto pelo Código Penal. Por outro lado, um caso de improbidade administrativa, mas que, como não tem lei, não pode gerar prisão.

Nesse caso, quando enquadrado como caso de improbidade administrativa, o responsável pode ser condenado a pagamento de multa, perda da função pública ou suspensão dos direitos políticos, por exemplo. "A rachadinha é com certeza um ato de improbidade", disse Marilda Silveira à BBC Brasil. "Crime depende, porque tem tipos fechados”, pondera.

Para Vera Chemim, rachadinha é crime. "Eu tendo a reconhecer que este ato corresponde a um crime, de corrupção, a partir do momento em que o agente, utilizando-se de sua função pública, acaba por obter uma vantagem econômica indevida”, finaliza.