
Causou preocupação em diversos especialistas na área da saúde a mentira dita pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em uma live transmitida nas redes sociais na última quinta-feira (21). Em seu discurso, o mandatário afirmou falsamente que um relatório do Reino Unido descobriu que pessoas vacinadas com as duas doses da vacina contra a covid-19 estão sendo diagnosticadas com AIDS, a síndrome de imunodeficiência adquirida. Os maiores e mais influentes médicos especializados no assunto desmentem a totalmente equivocada fala de Bolsonaro. Além disso, o próprio governo britânico afasta a possibilidade de existência do relatório mencionado.
Bolsonaro diz que vacina contra covid-19 causa AIDS
Procurado pelo portal G1, o Departamento de Saúde e Assistência Social do Reino Unido negou a existência do relatório lido pelo presidente do Brasil e disse que a mentira foi publicada em um site especializado em produção de fake news e teorias conspiratórias. Oficial de comunicações da Agência de Segurança de Saúde do Reino Unido, Zahraa Vindhani disse que "as vacinas contra a Covid-19 não causam Aids" e reforçou aquilo que já se sabe desde os anos 1980: "A Aids é causada pelo HIV."
O que dizem os médicos?
Em nota, o Comitê de HIV/aids da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) disse que "não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a COVID-19 e o desenvolvimento de síndrome da imunodeficiência adquirida". O comunicado foi endossado pela Associação Médica Brasileira (AMB). "Repudiamos toda e qualquer notícia falsa que circule e faça menção a esta associação inexistente", completa.
A microbiologista Natalia Pasternak escreveu no Twitter: "Vacinas não causam AIDS!!!! Nenhuma vacina!". Médico sanitarista, professor e pesquisador da Universidade de São Paulo, Daniel Dourado, concordou com Natalia:
Não existe NENHUMA possibilidade de vacina causar AIDS. ZERO. Qualquer que seja a vacina. É isso que precisa ser divulgado de forma clara e direta.
— Daniel A. Dourado (@dadourado) October 23, 2021
Ao G1, a mestre em imunologia pela USP, doutora em biociências e fisiopatologia pela Universidade Estadual de Maringá e professora titular na Universidade Paulista, Letícia Sarturi, apontou ainda inconsistências na notícia falsa apresentada por Bolsonaro.
"O artigo fala de uma possível redução de imunidade e degradação do sistema imune, que é por uma possível deficiência, mas ele não fala em nenhum momento como se chegou àqueles resultados. Em nenhum momento você tem como foi medida a porcentagem da imunidade. Porque a gente não mede a porcentagem da imunidade. Na imunologia, a gente pode medir o título de anticorpos, ou seja, quantos anticorpos estão sendo produzidos. Você pode medir a resposta imunocelular pela quantidade de células TCD8 e TCD4 que são direcionadas contra os vírus. Você consegue medir isso, fazer contagem de quantas células tem, você consegue titular o nível de anticorpos que o paciente tem. Então, você consegue fazer esse tipo de coisa em uma pesquisa. Mas você não consegue dar uma porcentagem de imunidade, porque imunidade é uma coisa muito subjetiva. Então, você não tem como falar: 'Essa pessoa tem tantos por cento de imunidade'. Você pode aferir alguns parâmetros do sistema imune, você pode aferir a imunidade celular pela quantidade de células que respondem. Você pode aferir a imunidade humoral pelo nível de anticorpos que há ali no organismo, mas não tem como calcular o percentual de imunidade. Isso é bem absurdo. O texto não fala em nenhum momento como isso foi calculado, qual a metodologia que foi usada para chegar a uma porcentagem. Ainda mais essa perda semanal de imunidade, isso é bem estranho", disse.
"O autor do texto fala que essa queda da imunidade se deve a uma deterioração do sistema imune porque os pacientes que estão sendo vacinados estão tendo imunodeficiência e isso é absurdo", acrescentou.
Fake News apagada
No domingo, o Facebook apagou da plataforma a live onde Bolsonaro falou as mentiras sobre a vacina contra a covid-19. De acordo com o portal Poder 360, o senador Alessandro Vieria (Cidadania-SE) pediu que a CPI da Covid-19 encaminhe o caso para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que é relator do inquérito das fake news.
“A democracia brasileira precisa urgentemente aprender a lidar com um PR [presidente da República] que comete crimes em série”, disse o congressista.