“Dias inesquecíveis de ativação, clareza, intencionalidade e verdades sobre como sermos e agirmos de forma conservadora e de direita”, foi assim que o pastor e cantor gospel André Valadão, definiu um evento organizado por ele nos Estados Unidos. Transmitido para milhares de pessoas no YouTube, a Conferência Governe abordou política e religião e chegou a juntar no palco o blogueiro foragido Allan dos Santos e o ministro das Comunicações, Fábio Faria.
A capacidade de unir nomes de peso do conservadorismo brasileiro apenas mostra a força de Valadão, que diariamente responde perguntas de seus seguidores. Em uma deles, o pastor é questionado: “Como pode haver cristão comunista?”. “Não tem como. Se você segue a Bíblia, a Palavra de Deus, não tem jeito de ser crente e comunista”, respondeu o popstar gospel, dono de um perfil com mais de 4,8 milhões de seguidores no Instagram.
Além dele, outro nome que destaca no campo de “influencer progressista” é o do teólogo, conferencista, escritor e youtuber Ed René Kivitz com pouco mais de 740 mil seguidores nas redes sociais.
O líder religioso ficou conhecido nacionalmente em julho de 2020, depois de afirmar em um culto que a Bíblia deveria ser “atualizada” para “não legitimar a escravidão”. Por causa disso, o pastor foi excluído da Ordem dos Pastores Batistas do Brasil em São Paulo.
Da mesma maneira que qualquer outro segmento da sociedade, é natural que esse tipo de debate seja pautado pelos líderes evangélicos nas redes sociais. É o que explica o antropólogo Mauro Lins, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). “O mundo evangélico é gigante e diverso. Da mesma maneira que qualquer outra pessoa eles expressam suas opiniões políticas”, aponta.
A capacidade de mobilização e de pautar o debate público é comparável ao registrado por perfis de políticos eleitos. Nas 4 plataformas, os 30 maiores influenciadores evangélicos têm 140 milhões de seguidores. Os 513 deputados e 81 senadores têm, somados, 187 milhões.
“Os evangélicos não são uma massa de manobra que não pensa, que não sabe o que quer. Se nos dedicarmos a observar as recentes pesquisas eleitorais, veremos que os evangélicos não aceitam acriticamente, tal qual um bloco monolítico, as orientações de seus líderes midiáticos”, defende o cientista político José Alexandre.
“Falar sobre política é legítimo. Instituições e personalidades se posicionam e abordam temas sociais que devem e merecem ser discutidos. Importante frisar, no entanto, que ninguém está acima da lei. Discurso de ódio, fake news e outras modalidades de crimes cibernéticos tipificados pela legislação são puníveis de acordo com as leis brasileiras, não de acordo com a Bíblia. Ninguém está acima da lei, independente do credo que professa”, diz Liniker Xavier, mestre em Teologia e doutorando em Ciências da Religião, que estuda a relação entre política e as igrejas evangélicas.
Apesar de influentes, os pastores e líderes evangélicos que se dedicam a defender posições políticas, reforçando a polarização, nas redes sociais são minoria. É o que aponta um levantamento feito pelo Sistema Analítico Bites.
Segundo a pesquisa, a maior parte não está usando as redes sociais para demonstrar apoio ao presidente Jair Bolsonaro ou criticar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Das publicações feitas pelos 30 principais influenciadores evangélicos, em só 4% há referência direta ao chefe do Executivo e críticas a Lula.
Além de não comentarem sobre a polarização entre Lula e Bolsonaro, possíveis adversários na campanha eleitoral pela presidência da República em 2022, os evangélicos donos das maiores contas no Twitter, Facebook, Instagram e YouTube também não adotam discurso negacionista sobre a pandemia.
O grupo não estimula posições contrárias à vacinação contra a covid-19 ou favoráveis a um possível tratamento precoce para a doença, temas que já foram, ou ainda são, difundidos por Bolsonaro. A defesa deste tipo de tema aparece apenas em 0,06% dos posts analisados –19, ao todo.
O discurso que nega a importância da vacinação também não esteve presente nos posts dos influenciadores evangélicos. A maioria, segundo o levantamento, reforça a necessidade da imunização, independentemente da origem das vacinas.
Lideranças das grandes igrejas evangélicas, com presença na mídia e influência política, formam uma importante base de apoio popular a Bolsonaro desde ao menos a campanha eleitoral de 2018. Depois que assumiu a presidência, em 2019, o mandatário reafirma o compromisso com o setor, ao participar de cultos e indicar um ministro evangélico para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Maior influenciador digital evangélico do Brasil, além de ser o dono do maior canal de YouTube de pregação individual do mundo, Deive Leonardo, porém, escolheu não comentar sobre política nos seus perfis. Com 31 anos, o pastor da igreja Assembleia de Deus em Joinville (SC), publica vídeos semanais com conselhos sobre questões individuais, como ansiedade, desânimo e medos.
“Eu fico um pouco decepcionado com o desequilíbrio emocional das pessoas de idolatrarem figuras, sejam elas da direita ou da esquerda”, disse ele em entrevista recente, defendendo que “a briga nunca é o melhor caminho”.
“Eu optei em não manifestar minha opinião publicamente justamente porque ambos os lados estavam sendo extremamente ofensivos. A briga nunca é o melhor caminho. Não fui chamado para ser alguém que defende um lado político, mas que prega a Palavra de Jesus. Por isso, eu preferi resguardar o meu direito de ter meu voto secreto”, concluiu.
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